85º aniversário do assassinato de Trotsky
- Paul Moorhouse
- Aug 23
- 6 min read

– Artigo publicado originalmente em inglês pelo Projeto para uma Internacional Marxista Revolucionária a 19 de Agosto de 2025 –
A 21 de agosto de 1940, o agente estalinista Ramón Mercader assassinou Leon Trotsky.
Na época, o jornal trotskista britânico Workers International News (WIN) descreveu como Mercader “atacou enquanto os dois tomavam chá… na casa de Trotsky na Cidade do México… depois de se ter feito passar por amigo e divulgador [das suas] teorias políticas durante algum tempo” usando “o mais grosseiro de todos os métodos concebíveis: esmagar a cabeça de um adversário político com um machado,… tipificando de forma adequada o mandante do crime em Moscovo e a cruel tirania desenfreada do regime político que ele personifica… [O] assassinato do último líder bolchevique sobrevivente, à exceção dos próprios perpetradores do crime, Stalin e Molotov.”
O WIN perguntava: “Porquê esse terrorismo e violência descontrolados por parte de Stalin? Porquê essa compulsão em eliminar Leon Trotsky?”
Trotsky esteve entre os principais dirigentes da Revolução Russa de 1917. O seu papel foi tão central que se dizia que muitos trabalhadores acreditavam que “Lenin Trotsky” era uma só pessoa. Liderou o Exército Vermelho na derrota tanto dos exércitos brancos czaristas como dos exércitos de intervenção — 180 000 soldados enviados por 16 potências capitalistas entre 1918 e 1921 — garantindo assim o Estado operário.
Com 26 anos, fora presidente do Soviete de Petrogrado de 1905, o protótipo dos conselhos operários com os quais os bolcheviques conquistaram e consolidaram o poder do Estado, com base na democracia operária, doze anos depois.
Revolução Permanente
Após a derrota daquela insurreição, no panfleto Resultados e Perspetivas, Trotsky expôs a teoria da “Revolução Permanente”, delineando o método sobre o qual se baseou a Revolução de Outubro. Trotsky explicava como, na era da crise imperialista e da guerra, a pequena classe trabalhadora de um país periférico como a Rússia poderia usar o seu peso social e independência para assumir a liderança das massas, derrubando o feudalismo e o despotismo czarista.
A fraqueza da burguesia russa, e a sua sujeição subalterna às grandes potências imperialistas e ao Estado czarista, tornava-a incapaz de cumprir tarefas que, na alvorada do capitalismo, em países como a Grã-Bretanha, França e EUA, a burguesia pôde, em maior ou menor medida, realizar: pôr fim à autocracia e à opressão nacional e resolver a questão da terra. O poder dos trabalhadores poderia colocar, pela primeira vez na História, a terra e a independência económica nas mãos da maioria camponesa.
Para garantir o novo Estado operário seria necessário tomar os monopólios capitalistas e desenvolver um plano socialista democrático de produção que atendesse às necessidades de toda a população e desenvolvesse a sociedade. Nas palavras de Lenine: “Socialismo = Poder Soviético + Eletrificação”.
Mas também seria necessário espalhar a revolução para além das fronteiras da Rússia, para evitar invasões contrarrevolucionárias de potências superiores e aproveitar os seus recursos industriais para construir uma federação socialista voluntária: uns “Estados Unidos Socialistas”, inicialmente da Europa e, em última instância, mundiais. Na teoria de Trotsky, a Revolução Permanente significava não uma “agitação perpétua”, mas a passagem ininterrupta da revolução das tarefas da burguesia para a revolução operária e da revolução nacional russa para a revolução mundial.
Foi por isso que Trotsky, Lenine e a direção bolchevique gastaram tempo e preciosos recursos do nascente Estado operário para fundar a Internacional Comunista em 1919 e que Trotsky se opôs à política de Stalin do “Socialismo num só país” – que falsamente exaltava a derrota e o isolamento como vitória, em benefício da casta burocrática que se ergueu no poder, banqueteando-se sobre o cadáver da revolução mundial.
A Revolução Traída
Na sua análise de 1936, A Revolução Traída, e em muitos artigos e panfletos, Trotsky expôs Stalin, a burocracia que ele personificava e o seu papel na contrarrevolução burocrática interna e na traição e massacre dos trabalhadores revolucionários na China, Alemanha, Espanha e inúmeros outros países no mundo.
Entre as passagens mais importantes de A Revolução Traída está a acusação de Trotsky contra a contrarrevolução nas relações de género, o Termidor na Família, em que ele descreveu como a usurpação do poder estatal por uma burocracia privilegiada e a sua reconciliação com o domínio capitalista para além das fronteiras da União Soviética levou diretamente ao restabelecimento da família como instrumento de opressão de género e geracional:
“As leis sobre casamento e família estabelecidas pela Revolução de Outubro, outrora motivo do seu legítimo orgulho, estão a ser reformuladas e mutiladas com extensas cópias das legislações burguesas. E, como se fosse de propósito para carimbar a traição com ridículo, os mesmos argumentos que antes eram avançados em defesa da liberdade incondicional de divórcio e aborto – ‘a libertação da mulher’, ‘a defesa dos direitos da personalidade’, ‘a proteção da maternidade’ – são agora repetidos em defesa da sua limitação e proibição completa… O motivo mais premente do presente culto da família é, sem dúvida, a necessidade da burocracia de uma hierarquia estável de relações, e de disciplinar a juventude por meio de 40 milhões de pontos de apoio à autoridade e ao poder.”
Por estas razões, apesar de o ter forçado ao exílio, perdido a 10 000 km de casa e, nas palavras do New York Times, sozinho “num planeta sem visto”, Stalin e a burocracia temiam Trotsky como uma acusação viva e pulsante da sua monstruosa ditadura e a sua sobrevivência como uma vindicação de cada vida perdida e corpo encarcerado no gulag.
Uma nova Internacional
A sua vida no exílio foi dedicada à tarefa de organizar aqueles camaradas que rejeitavam as traições do stalinismo nos núcleos de novos partidos revolucionários, primeiro como a Oposição de Esquerda Internacional (OEI) e, a partir de 1938, como uma nova “Quarta Internacional”, sob a sombra do fascismo e da perspetiva iminente de uma nova guerra mundial.
Oitenta anos depois, o PRMI (Projeto para uma Internacional Marxista Revolucionária) retoma essa tarefa numa nova era de reação, guerra e genocídio, e temos muito a aprender com a forma como Trotsky a abordou na sua última década. Ele acreditava que, para que uma internacional sobrevivesse, precisava de lançar raízes profundas entre as massas mais oprimidas. Em 1932 escreveu ao secretariado da OEI, sublinhando a importância de uma carta que haviam recebido de 24 trabalhadores negros na África do Sul:
“A Oposição de Esquerda (bolchevique-leninista) pode e deve tornar-se a bandeira das camadas mais oprimidas do proletariado mundial e, consequentemente, antes de mais nada, dos trabalhadores negros. Em que baseio esta proposição?
“A Oposição de Esquerda representa atualmente a tendência mais consequente e mais revolucionária do mundo. A sua atitude criticamente aguçada face a todas as variedades de arrogância burocrática no movimento operário torna possível prestar particular atenção à voz das camadas mais oprimidas da classe trabalhadora e dos explorados em geral.
“Os camaradas sul-africanos expressaram especial interesse pela… Revolução Chinesa. Isto… é totalmente justificado. As massas trabalhadoras dos povos oprimidos que têm de travar a luta pelos direitos nacionais elementares e pela dignidade humana são precisamente aquelas que correm maior risco de sofrer as penalidades dos ensinamentos confusos da burocracia stalinista… O programa da revolução permanente, baseado na incontestável experiência histórica de vários países, pode e deve assumir significado primordial para o movimento de libertação do proletariado negro.
“Os camaradas de Joanesburgo podem ainda não ter tido a oportunidade de se familiarizar mais de perto com as opiniões da Oposição de Esquerda sobre todas as questões mais importantes. Mas isto não pode ser obstáculo para nos aproximarmos deles o máximo possível neste exato momento e ajudá-los fraternalmente a entrar na órbita do nosso programa e das nossas táticas.
“Quando dez intelectuais, seja em Paris, Berlim ou Nova Iorque, que já foram membros de várias organizações, nos dirigem um pedido para serem admitidos entre nós, eu daria o seguinte conselho: submetam-nos a uma série de testes sobre todas as questões programáticas; deixem-nos à chuva, sequem-nos ao sol, e depois, após um novo e cuidadoso exame, aceitem talvez um ou dois.
“O caso é radicalmente diferente quando dez trabalhadores ligados às massas se dirigem a nós. (…) Mas se um grupo proletário atua numa área onde há trabalhadores de diferentes raças e, apesar disso, permanece composto apenas por trabalhadores de uma nacionalidade privilegiada, então inclino-me a vê-los com desconfiança. Não estaremos a lidar talvez com a aristocracia operária? O grupo não estará infetado por preconceitos escravistas, ativos ou passivos?
“É uma questão totalmente diferente quando somos abordados por um grupo de trabalhadores negros. Aqui, estou preparado para dar como certo, de antemão, que chegaremos a um acordo com eles, mesmo que tal acordo ainda não seja efetivo. Porque os trabalhadores negros, em virtude de toda a sua posição, não procuram nem podem procurar degradar ninguém, oprimir ninguém ou privar alguém dos seus direitos. Não procuram privilégios e não podem ascender ao topo senão pelo caminho da revolução internacional.
“Podemos e devemos encontrar um caminho para a consciência dos trabalhadores negros, dos trabalhadores chineses, dos trabalhadores indianos e de todos os oprimidos no oceano humano das raças de cor, a quem pertence a palavra decisiva no desenvolvimento da humanidade.”



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